6 de agosto de 2008

Lembranças

A vontade de ter uma menina era tão grande que eu podia jurar que era menino, só pra não me decepcionar quando o bebê nascesse.

No dia sete de setembro de 98, entrei em trabalho de parto. Não quis saber o sexo durante as ultra-sonografias; a emoção da surpresa na hora do parto me encantava.

Pude ouvir seu choro forçado expelindo o líquido amniótico. Eu, quase desfalecida, perguntei ao médico se ele estava bem.

- Ele? É ela, mãe! É uma menina! Qual o nome dela?

- Rafaela.

Foi a única vez que desmaiei em toda a minha vida.

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Anos depois, minha mãe veio me perguntar o motivo do nome Rafaela, já que até o nascimento meu bebê se chamaria Vinícius e tinha roupas azuis, verdes e amarelas.

Disse a ela que tinha me decidido por um nome ali, durante o parto. Ela me disse que Rafaela era o nome que meu pai gostaria de ter me dado, não fosse a imposição dela: Taisa. O Tayza veio depois que meu pai decidiu incrementar o nome que minha mãe escolhera.

Ele partiu em novembro de 1989. Teve um AVC enquanto estava viajando pro lugar que hoje chamo de “roça”, Santa Rita da Floresta. Eu com 6 anos, meu irmão com 1 ano e 3 meses e minha mãe estávamos lá, esperando por ele. Ele estava de férias e ia pra lá para passar o Natal conosco.

Meu tio, minha madrinha e meu primo o viram entrar em coma. Ele estava de carona no carro. Meu tio conta que ele estava reclamando de dor de cabeça desde o início da viagem. O primeiro a notar que ele não estava bem foi meu primo, que é 1 ano mais jovem que eu.

Me lembro de poucas coisas do período entre meus seis e onze anos: dois amigos que fiz, minha avó andando de bicicleta... mais nada. Fiquei sabendo, já bem mais velha, que tive anorexia e dizia que queria morrer para me encontrar com ele. Me levaram a um centro espírita, disso me lembro. Mas de mais nada.

Na conversa em que a minha mãe me perguntou sobre o nome que dei à Rafa, ela me contou que ele partiu achando que ela não o amava mais. Eles tinham brigado antes da viagem dela à roça, e tinha sido uma briga feia. Ele ia fazer uma surpresa para ela, pois não tinha avisado que estava indo pra Santa Rita.

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A memória do portão de ferro se abrindo, das rosas da casa da minha avó e do nosso último abraço nunca mais deixou minha mente. Hoje eu sei que naquela época eu sabia que aquela era a nossa despedida, porque eu nunca abracei alguém tão profundamente.

Mesmo dezenove anos depois o Dia dos Pais continua sendo um dia difícil pra mim. A semana inteira é assim, regada a lágrimas, lembranças... vazio e saudade.

Prometi a mim que não escreveria mais sobre assuntos tristes aqui, pois não vale a pena ficar reclamando de problemas meus. Mas não vejo esse assunto como um problema particular compartilhado. Vejo como uma mensagem que vale ser dividida com qualquer pessoa.

Minha mãe nunca mais teve paz, pelo fato de achar que meu pai faleceu sem ter certeza do amor dela. E ela ainda o ama muito.

Certamente, o último pensamento do meu pai foi a família dele, principalmente a minha mãe, que nunca teria certeza sobre o interesse de reconciliação dele.
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Ver minha mãe contando essa história dói insuportavelmente. Também nunca esquecerei da expressão no rosto dela enquanto relatava todos os detalhes de tudo o que aconteceu.

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Saudades e lágrimas, mais uma vez. E será assim por toda semana e por toda a minha vida.

Escrevi esse post hoje porque no domingo certamente não conseguirei fazer nada...

Espero de coração que todos tenham entendido o recado.

Abraço,

TC

2 comentários:

RodOgrO disse...

Tata, o texto está LINDO. Não consigo imaginar o que você está sentindo, mas tô à disposição pra ajudar vc a enfrentar e aguentar a barra, viu?! Beijãos!

Anônimo disse...

Querida essas coisas são mto delicadas mesmo. Despedir-se de alguém nunca é fácil, menos ainda qdo a gente queria dizer tanta coisa e não tem essa chance.

Mas vc sabe que a vida sempre faz as coisas certas... veja que presente vc ganhou (e ele tb, lá no céu) uma neta com o nome que ele queria dar para vc! E um dia flor vcs vão estar juntos mais uma vez, isso aqui é só um período longe dos que voltaram para casa antes de nós.

E outra coisa.. esse assunto não é um "problema" e vc não está reclamando, está dividindo conosco algo que é parte da sua vida, são suas emoções e isso deve ser compartilhado sim. Por que não? A tristeza tb faz parte da vida.. mas acima disso está o que aprendemos com a experiência e como ela nos faz amadurecer.

Eu sei o quanto é difícil falar dessas coisas... como sei. Fique bem minha queria amiga!